sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Argentina condena 18 militares por tortura e homicídios durante ditadura




Tati Almeyda (dir.), integrante da organização Mães da Praça de Maio, comemora
condenação de militares em Buenos Aires, na Argentina (26/10). Foto: Reuters

 

Entre os condenados está Alfredo Astiz, o 'anjo da morte', considerado responsável por morte de freiras e ativistas


Oito anos após o fim das leis de anistia, a Justiça da Argentina condenou, na quarta-feira, 18 militares por crimes contra a humanidade.
Os oficiais foram responsabilizados por torturas e mortes ocorridas na Escola Superior da Marinha (Esma), em Buenos Aires. Na sentença, treze foram condenados à prisão perpetua e os outros a mais de dezoito anos de prisão.
Trata-se do julgamento que reuniu o maior número de militares desde que as leis que anistiavam os oficiais da última ditadura argentina foram revogadas, em 2003.
O júri também é o primeiro da chamada "mega causa da Esma", por reunir centenas de casos. A Esma foi definida por entidades de direitos humanos como "um dos maiores centros de detenção clandestina e de extermínio" da última ditadura argentina (1976-1983).
Durante a leitura da sentença, o juíz disse que os réus foram "condenados por perseguições, homicídio qualificado e roubo de bens da vitima".


Veredicto
Os acusados foram condenados por crimes contra 86 pessoas, das quais 28 continuam desaparecidas e cinco foram assassinadas. A decisão da Justiça foi tomada após 22 meses de investigação. Mais de 160 pessoas foram ouvidas.
O veredicto foi transmitido ao vivo pelas principais emissoras de televisão do país e através de um telão em frente ao tribunal, em Buenos Aires. Familiares das vitimas acompanharam o julgamento na sala de audiência do tribunal e aplaudiram quando foi lida a sentença.
A Justiça estima que cinco mil vítimas da ditadura argentina passaram pelas instalações da Esma. Entre as vitimas "de tormentos e homicídios" está Azucena Villaflor, uma das fundadoras da organização Mães da Praça de Maio, que denunciava a repressão e procurava um filho desaparecido na época.
Duas freiras francesas que apoiavam o grupo, Alice Domon e Leonie Duquet, e o escritor Rodolfo Walsh também estiveram presos na Esma. "É um dia histórico. Marca o enorme avanço na luta coletiva pelos direitos humanos", disse Patrícia Walsh, filha do escritor, cujo corpo nunca foi encontrado.  No local chegou a existir uma maternidade clandestina, segundo a organização Avós da Praça de Maio.
O grupo luta para identificar os filhos de militantes que deram a luz no local e tiveram seus bebês adotados por membros da ditadura.
Entre os condenados a prisão perpétua está o ex-capitão de fragata Alfredo Astiz, que ficou conhecido como "anjo loiro" ou "anjo da morte". Astiz foi acusado de se infiltrar em entidades de direitos humanos e de entregar doze pessoas aos repressores, entre as quais Azucena Villaflor.
Em entrevista à BBC Brasil, a advogada Carolina Varsky, da ONG CELS (Centro de Estudos Legais e Sociais), disse que o veredicto era esperado "há muito tempo". "Muitas famílias lutaram durante anos por este momento", disse.

Anistia
A investigação sobre os crimes cometidos na Esma foi aberta nos anos 1980, após a redemocratização do país. O inquérito foi depois arquivado com as leis do Ponto Final (1986) e da Obediência Devida (1987). As leis, que anistiaram os agentes da ditadura, foram promulgadas durante o governo do presidente Raul Alfonsín (1983-1989).
Em 2003, o Congresso aprovou um projeto de lei enviado pelo então presidente Nestor Kirchner (2003-2007) que abriu caminho para o retorno dos julgamentos. Na mesma ocasião, a Justiça também declarou inconstitucionais os indultos dados pelo ex-presidente Carlos Menem (1989-1999) beneficiando repressores e ex-guerrilheiros.
Ativistas de direitos humanos esperam que a Justiça ainda dê seu veredicto sobre casos vinculados aos chamados 'voos da morte', quando presos políticos eram lançados vivos no rio da Prata e no mar. Por determinação do ex-presidente Kirchner, a Esma foi transformada em um "centro cultural e de memória".

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